COMO VOCÊ ESTÁ?

15/06/2012 17:44

 

Como você está?

Pergunta fácil de ouvir, porém, não tão fácil de responder. Alguns não sabem respondê-la, pois não fazem ideia de como estão. Outros, simplesmente, dizem o que primeiro apontou em suas mentes, o que nem sempre é fidedigno. Há, ainda, os que preferem omitir a verdade por medo, vergonha ou interesse.

O texto de hoje acompanha os anteriores no convite ao autodescobrimento. Percebe-se. Este será o tema para nossa reflexão desta semana.

Coragem,

Andréa

 

 

COMO VOCÊ ESTÁ?

 

Certo dia, amanheci com um aperto no peito. Fiquei com está sensação até o final do dia. O que poderia ser? Não conseguia pensar em nada. Na verdade, não tive tempo de pensar em nada. Foi um dia corrido desde o momento que levantei da cama: muito que fazer, muito que decidir.

Ao voltar para casa, no finzinho do dia, estava exausta, sem energia. Ainda sem tempo para refletir, arrumei-me rápido e fui para Casa do Cristo. Quando lá cheguei, todos já me esperavam. Como de costume, estavam reunidos no refeitório coletivo, a compartilhar o dia. Aproximei-me devagar, na tentativa de criar um espaço, dar-me tempo para refletir sobre o meu dia. Não queria levar aos outros o obscuro que me acompanhava.

Porém, nada chegava com clareza à minha consciência.  Pensamentos de fuga me chegavam a todo instante. Pensei em retornar, mas era tarde demais. Os amigos vieram me abraçar e foram logo questionando sobre o que havia de errado comigo.

- Nada. Respondi em disfarce.

- Como nada? Você está diferente. Eu diria, visivelmente, angustiada.

Santa ilusão acreditar que não somos verdadeiramente percebidos. Que podemos nos esconder debaixo das falsas máscaras que construímos. Derrotada, abaixei os olhos e chorei. Não sabia responder o porquê, mas as lagrimas rolavam pela minha face sem controle. Fui abraçada, acolhida, senti-me amada.

Como por milagre, imagens foram se formando em minha mente e pude perceber a minha solidão.

– Como assim solidão?

Eu vivia arrodeada de gente durante todo o tempo. As pessoas me procuravam a cada instante. Nunca estava só.

Meu esposo e filha vieram correndo ao meu encontro. Preocupados, tentavam, assim como os outros, compreender o que acontecia.

– Não sei.

Foi tudo que me atrevi a dizer naquele momento. Enxuguei os olhos e esforcei-me para deixar que um sorriso brotasse dos meus lábios.  Agradeci o carinho e atenção que recebi e chamei-os para reunião.

Pedi ao amado esposo que fizesse a oração inicial. Samanta fez a leitura e iniciou a reflexão que se estendeu com a participação dos presentes. Quanto a mim, estava longe. No labirinto profundo do meu ser. Somente assim poderia descrevê-lo naquela noite: um labirinto. Escuro, sombrio, empoeirado. A única clareza que cheguei foi a de que precisava de atenção e cuidado. Ao perceber minha ausência, mesmo que presente, Samanta tomou a frente, concluiu as reflexões e pediu a Jonas que fizesse a oração final. Terminamos os trabalhos daquela noite.

Compreendendo meu estado de torpor, despediram-se e partiram sem mais nada perguntar. Retornei para casa em silêncio, abraçada a minha família. Organizei o que precisa e botei minha filhota para dormir. Meu anjinho abraçou-me forte e, em meu ouvido, sussurrou:

- Deus quer falar com você.

Nada pude dizer. Beijei-a e me recolhi.

Meu marido compreendeu que eu precisava do recolhimento. Simplesmente me disse que estava ao meu lado e que eu poderia contar com ele. Novamente, permiti a presença das lágrimas, porém, desta vez foram mais suaves. Meu sorriso brotou sem dificuldade, direcionando-se para ele.

Já no leito, ofereci a Deus meu coração, meus sentimentos e pensamentos. Coloquei-me a disposição para a conversa anunciada.

Logo dormi e despertei ao lado dos velhos amigos. Receberam-me com afetuosidade e compreensão. Voltei a chorar. Envergonhada, escondi a face com as mãos. Samuel abraçou-me e me conduziu pelo jardim. Sentamos num banco conhecido e ficamos em silêncio por alguns instantes.

Comecei a observar aquele lindo lugar. Já havia estado lá muitas vezes, porém, o visualizei como se fosse a primeira vez. Meu peito encheu-se de saudade e deixei-me chorar sem culpa ou vergonha. Quando mais calma, Samuel dirigiu-se a mim amorosamente.

- Não é fácil ficar tanto tempo longe de casa. Lembro-me que, por muitas vezes, em minha última encarnação, encontrava momentos para um cochilo a fim de retornar e matar um pouco da saudade. Eram instantes gloriosos. Sempre retornava fortalecido, energizado para continuar a caminhada.

- Querida amiga, tem exigido muito de si mesma. Tem se dedicado exclusivamente ao outro, esquecendo-se de si. Lembre-se, também é um espírito e, assim como todos os outros, necessita de acolhimento e suporte.

- Não tenho tido tempo para isso, Samuel. Bem sabe que são muitas as demandas. Chegam-me a todo o instante, de toda parte em busca de auxílio. Como posso eu negar-me atendê-los?

Fitou-me como um pai e disse:

- Minha querida, faz-se mister encontrar o equilíbrio. Acreditar que é possível responder a todos os questionamentos e mazelas do mundo é infantil e irresponsável. Não pode prometê-lo a quem a procura. Esqueceu-se que a dor também é cura?

- Olhe para você mesma. Foi o sofrimento que a trouxe aqui. Acha que sairá igual ao que chegou? Pois lhe afirmo que o incômodo leva-nos a busca, instalando em nós o processo de crescimento. É preciso crescer e deixar crescer.

A vergonha novamente me encontrou, mas no desespero de concertar o erro que acabara de identificar. Expeli justificativas implausíveis.

-Mas este não é o meu papel. Acolhê-los. Auxiliá-los. Tenho tentado me dedicar a minha missão. Não é isso que vocês esperam de mim.

- O Cristo está feliz com sua dedicação e trabalho, porém, nem Ele e nem nós lhe pedimos sacrifícios. Não lhe impomos que deveria auxiliar outros espíritos em detrimento do seu. Isto seria inaceitável e imprudente.

- Também os missionários precisam se manter em acordo com as leis do universo. Você bem sabe que não é fácil a vida fora do plano em que se encontrava. Faz se necessário o esforço para vibrar na mesma energia que já havia conquistado. A densidade energética está presente no planeta e é preciso superá-la.

E continuou.

- Volte-se para você. Ouça-se. Acolha a si mesma e cuide-se. Lembre-se que também está em processo de evolução. A evolução no outro, que ajuda a construir, é fonte de alegria e inspiração, porém não deve ser o objetivo único de sua existência, pois assim deixará a terra no mesmo patamar que estava quando a ela chegou. Busque o crescimento pessoal. Por mais que se ajude e seja ajudado a construí-lo, ele é um processo individual e intransferível. Cabe a cada espírito fazê-lo em consonância com suas facilidades e dificuldades.

Uma sensação de calma me tomou. Olhei-o com carinho e agradeci. Pedi para ficar mais um pouco a refletir. Ele concordou.

Acordei na manhã seguinte revigorada. Corajosa, busquei a companhia do esposo e dividi com ele minha experiência. Deixe-me acolher e orientar por ele. E assim fiz com os amigos. À noite, quando cheguei ao refeitório coletivo, coloquei-me como um ser que também precisa ser ouvido e ajudado. Naquele dia e nos outros também, fui mais amada porque passei a ser um no todo. Igual em necessidades e diferente na forma de lidar com elas.

Rute

14.06.12

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