CRÔNICAS ESPÍRITAS - 12
A crônica espírita de hoje trata dos atos de violência que vivemos nesse início de ano, principalmente o que se deu na França, na redação do Charles Hebdo.
Antes de qualquer coisa, se trata de uma opinião da nossa colunista, e o fato dela poder ser dada já significa muito para cada um de nós.
Que tal pararmos um pouquinho para acessarmos essas opiniões (no plural, pois também temos o texto de Divaldo Franco sobre o tema) e gestarmos a nossa?
Ótimo exercício para o dia de hoje.

CRÔNICAS ESPÍRITAS - 12
Os recentes atentados na França mobilizaram a opinião pública de maneira diversa. Os informes recorrentes na mídia, sobretudo na televisiva, despertaram no ocidente, notadamente no hemisfério norte, um temor real ao terrorismo.
Incidentes pontuais já haviam ocorrido na Europa, e até mesmo com um número maior de vítimas, porém com a guerra na vizinha Síria, as distancias estreitaram-se. Desde o incidente de 11 de Setembro em Nova York, não havia tanta comoção no ocidente.
Infelizmente as barbáries praticadas por esses seres transviados continuam fazendo mais e mais vítimas, principalmente na, já tão sofrida, África.
O mal, com vários nomes e facções, utiliza a infeliz máxima: “dividir para governar”, aterrorizando os cidadãos do mundo. E às vezes tem sucesso ao dividir países, religiões e nações inteiras, espalhando o vírus da discórdia e da intolerância.
O medo natural pode gerar mais pavor e por consequência mais divisões nas correntes de ideias. Até aí tudo bem, pois temos o direito de pensar de modo diferente, mas temos o dever de respeitar as diferenças, com a responsabilidade implícita sobre todos os nossos atos.
O mal disfarçado de ideologia, seja política, religiosa ou social, procura encontrar nas “sombras” individuais uma justificativa, “pseudo-plausível”, para o mal em si mesmo.
Recebi algumas mensagens e li comentários variados, muitos deles apaixonados, acerca da frase “Je suis Charlie”. Esta frase forte incitou na consciência de muita gente algum tipo de reação.
Algumas pessoas deram maior importância, com julgamento de valores, à própria frase e ao conteúdo das charges do Charlie Hebdo, que ao ato de terror em si. Passaram então aos chargistas irreverentes a culpabilidade pela sua morte trágica devido à “provocação”.
Bem, esses ilustres desconhecidos de muitos tiverem seus trabalhos amplamente divulgados. As charges que vi, tinham para mim, na sua maioria um gosto duvidoso e iam de sátiras inteligentes a um punhado de desenhos grotescos.
Não sei se compraria o seu jornal, mas certamente, não questiono o seu direito de expressão. As leis de cada país mantêm regras quanto à “liberdade de imprensa” e aos ofendidos o sistema judicial propicia vários tipos de processo.
Lembro-me um espetáculo dantesco de um determinado pastor que chutou e proferiu impropérios contra uma imagem da Virgem Maria há poucos anos atrás. Despertou reações indignadas, mas não foi morto por isso e sim processado. Os civilizados não podem agir de outro modo, a não ser respeitando a ética vigente e o sistema legal de uma nação.
E lembro mais ainda, que ao responder a alguém muito aborrecido com o fato e que me perguntou sobre as imagens polêmicas, disse que as achei de muito mal gosto e inadequadas, mas que o indivíduo desrespeitou a si mesmo e não à própria Maria, que estaria muito acima dessa questão e possivelmente teria e tem ainda muito trabalho a fazer com tantas preces e pedidos que fazemos a Ela. O interlocutor de então, quase transferiu sua raiva do infeliz incidente para mim, pois não esperava esta resposta, mas depois parou um pouco e reconheceu o meu direito à opinião própria.
Uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa.
Análises simplistas e reducionistas chovem com argumentos díspares e falaciosos.
Peço apenas a vocês leitores, um pouco de paciência para lerem com calma os comentários alheios e tirarem as suas próprias conclusões, inclusive sobre esse texto.
Têm todo o direito de discordar, concordar com o todo ou em parte, e lançarem sua própria opinião.
Penso na Declaração Universal dos Direitos do Homem e dos limites, por vezes tênues, entre a liberdade, a responsabilidade e a ética.
Afinal, temos o direito à livre expressão ou não?
Temos o direito à crítica, à crítica aos críticos, sem nos eximirmos da autocrítica?
Encerro com esse providencial texto de Divaldo P. Franco, publicado no Jornal A Tarde em 15/01/2015.
Ante o terrorismo
“O golpe foi de uma crueza ímpar. Ainda nos encontramos chocados. Repetiu-se a tragédia que vem ameaçando as criaturas humanas nos últimos anos, tal seja, o terrorismo provocado pelo fanatismo religioso perverso. A resposta da França e da sociedade foi imediata, enquanto se mobilizaram todos os recursos possíveis, para alcançar-se os criminosos e puni-los devidamente. Os direitos humanos, especialmente o da liberdade de pensamento, de palavra e de ação, são inderrogáveis. Conquistados com incontáveis sacrifícios ao largo dos séculos, são uma das mais grandiosas conquistas do processo evolutivo da sociedade.
Ninguém pode interditar a liberdade de movimento e ação das criaturas humanas, nem proibir, perseguir, impedir a liberdade da palavra, seja ela verbal ou gráfica, exceção feita por ocasião de regimes arbitrários. Se tal viesse a acontecer, e às vezes ocorre, trata-se de um terrível retrocesso ao passado lamentável, quando éramos escravos da prepotência e da estupidez.
No caso em foco, o lápis é mais poderoso do que o fuzil. Mata-se o indivíduo, mas não se aniquila o pensamento, que somente pode ser suplantado por outro de maior magnitude. Herança da barbárie, o fanatismo religioso, político ou qualquer espécie, indignifica o ser humano e dele faz vítima do sicário das vidas que o cercam.
Isto somente ocorre em razão do estágio primário do processo antropológico da evolução, que retém o indivíduo na furna do egoísmo e do atraso moral.
É inevitável que cresçamos na direção da plenitude, e o amor com respeito ao direito alheio é o sentimento que deve permanecer inviolável em todos os passos da sociedade.
Todos devemos repudiar a intolerância, a prevalência da força sobre o direito à vida, contribuindo de maneira eficaz pela solidariedade, para que alcancemos a meta pretendida que é a felicidade. Repito com os milhões de cidadãos que hoje levantam a bandeira da liberdade proclamando: Je suis Charlie.”
Muita PAZ para todos nós.
Francesca Freitas
23-01-2015
