MEMÓRIAS
Esta semana, no Momento de Luz, Gregório e seu grupo retornam a antigas memórias em busca do amor. Percurso que os levarão a descobertas e reflexões.
“O amor é o rio onde se afogam os sofrimentos, pela impossibilidade de sobrenadarem nas fortes correntezas dos seus impulsos benéficos. Sem ele a vida perderia o sentido, a significação. Puro expressa, ao lado da sabedoria, a mais relevante conquista humana.” (Joanna de Ângelis, O Homem Integral).
Boa reflexão!
Andréa
MEMÓRIAS
Do mais alto só podemos esperar compreensão e atitudes amorosas. Do Pai não recebemos exploração, descontentamento, revolta, agressão, violência. Isso vem de nós: homens.
Certa manhã, despertei animado. Recomeçaríamos o período de aulas, depois de duas semanas frente a assuntos urgentes. Não foi fácil, para mim, ficar longe da preparação para nossa segunda viagem a terra.
Como sabem, sou extremamente ansioso, fato que tenho tentado modificar. Samuel e muitos outros instrutores foram reunidos para orientações urgentes. Situação que me causava intensa curiosidade.
Chegada a hora da reunião, fomos entrando um após o outro na grande e iluminada sala que nos abrigava. Era confortável e útil. Possuía uma mini biblioteca, computadores, material suficiente para estudos e planejamentos.
Sentávamos ao redor de uma grande mesa, onde cada um possuía um lugar especifico. Isto porque, cada um recebia, no seu lugar, o material necessário a sua condição. Melhor explicar.
Na mesa, cada membro acessava o que lhe era necessário: informações de sua própria vida, mensagens da família, material didático. Poderia acessá-los de qualquer lugar, mas era necessário cadastramento prévio e autorização, o que não exigia alguns minutos.
Porém, diante do lugar, previamente, escolhido, tudo nos chegaria a poucos segundos, devido á autenticação instantânea diária. E assim, ganhávamos tempo.
Os estudos duravam oito horas por dia. Divididos em momentos teóricos e práticos. Uma vez na semana saíamos a campo, o que poderia ocorrer durante vinte quatro horas. Eram meus dias preferidos.
Não que eu não gostasse da teoria, mas sair a campo era emocionante. Indescritível. Mas tentarei compartilhar com vocês. Não antes de explicar-lhes quanto o acesso as informações da própria vida e das mensagens da família.
O trabalho era árduo, e para manter-nos focados recebíamos as orações que partiam do coração dos que nos amavam. Não imaginam como isso funciona. Encarnados ou não, emanamos energias amorosas para quem amamos.
E elas nos chegam sempre ao coração, acalmando-nos e incentivando-nos a seguir. Porém, ao acessá-las pelos olhos e ouvidos, têm uma concepção diferente em nós, iniciante na vida espiritual. Se é que posso chamar assim.
Para nós que estamos nos readaptando a vida por aqui, têm um significado grandioso. Passamos a nos sentir amados, perdoados, compreendidos. Parece besteira. Podem pensar: Já não estão envolvidos no puro amor?
Não é fácil receber o amor comunitário. Parece-nos estranho, uma vez que não estávamos acostumados. Leva tempo para nos sentir uma única família.
Já receber o amor de quem conhecemos e aprendemos a amar, durante uma ou mais vidas, torna o coração fortalecido e preparado para esta nova qualidade do amor.
Exatamente por isso, recebemos informações de nossas vidas passadas. Para reconhecermos pessoas queridas. Lembrarmo-nos dos momentos felizes, onde o amor se fazia presente. E dos momentos infelizes, onde o deixamos de lado, trocando-o por banalidades.
Sofremos ao reconhecer em nós a ausência do amor, ou a nossa displicência perante ele. O que nos encoraja a buscá-lo e vivê-lo. E como fazê-lo agora? Na primeira vez, parecia impossível retomar o amor.
Mas quando se acredita no amor e deseja vivê-lo, as oportunidades para vivenciá-lo, simplesmente, aparecem. Porém, é preciso ficar atento. Lembro-me dos muitos momentos, após decidir vivenciá-lo, que ocorreram sem o meu menor esforço para encontrá-los.
O amor simplesmente vive dentro de nós e quer deixar-nos para encontrar o outro e assim retornar para nós, mais belo, mais intenso, mais feliz. Precisamos, simplesmente, permiti-lo sair e entrar. Simplesmente, naturalmente, assim flui o amor em nós.
Na primeira lição prática que tivemos, retornamos ao seio familiar e revivemos o amor. Fiquei maravilhado! Voltei as memorias de infância, aos braços maternos e senti toda a devoção de uma mãe.
Ao recorrer aos braços paternos, pude perceber a aflição de um pai que deseja o melhor para o seu filho e, pela primeira vez, compreendi sua forma de ser e agir.
Diante do medo de não conseguir fazer e do tamanho das responsabilidades que acreditava possuir, se desiquilibrava e nem sempre agia como eu queria ou esperava, mas sempre dava o melhor de si. Naquele dia, perdoei meu pai por suas falhas e o amei intensamente.
Ao retornar a sala, para a reflexão da tarefa realizada, Samuel nos acolheu como filhos. Aguardou que nos repuséssemos das emoções vividas e nos cedeu à palavra.
Luís se antecipou a nos outros e disse com a voz ainda embargada:
- Não me pareceu, quando ainda estava em vida, juntamente com os meus, que meu pai sabia o que estava fazendo. Recorria a minha mãe a cada decisão destinada a seus filhos. Deixava-nos cedo e só retornava ao fim da tarde. Cansado recolhia-se, não antes de nos dar a benção.
Sentíamos sua ausência. E mamãe nos confortava, dizendo que ele nos amava e se estava ausente era para o bem de nossa família. Nunca consegui compreendê-lo.
Como deseja-nos o bem, se nunca o víamos ou conversávamos com ele? E a forma severa que reagia ao mais simples problema doméstico? Lembro-me de uma vez que levei uma grande surra, sem nada fazer para merecê-la. Ele não quis me ouvir, só empregou o castigo.
Neste dia, desisti dele. Arrumei minha sacola e partir para a casa ao lado, de quem considerava meu pai, o velho avô que sempre me ouvia e tinha o que dizer. Não mais voltei para casa. Pouco nos falamos depois. Via-o de longe e sempre que podia desviava o caminho, o olhar.
Hoje, ao receber suas orações, não pude acreditar no amor que sentia por mim.
Neste momento chorava copiosamente. Precisou de tempo para que a voz pudesse sair novamente. Samuel, o tio companheiro, que conhecia o irmão de velhas jornadas, abraçou o sobrinho, compreendendo os dois lados.
Após uma pequena pausa, o querido amigo Luís continuou:
Não compreendo porque só agora me foi revelado o amor e as dificuldades de meu pai de senti-lo e revelá-lo.
Meu caro Luís, tudo nos chega na hora certa. Somente agora se permitiu conhecer este lado de sua história. Nem sempre estamos preparados para escutar, acolher e compreender a nós mesmos e ao outro.
Muita são as dificuldades que encontramos em viver nossas fragilidades e nelas é que encontraremos nosso verdadeiro aprendizado. Para tanto é preciso ter coragem de enfrentá-las.
Faz-se necessário acolhe-las. Compreender seus significados. Buscar suas causas. E assim, poder compreendê-las e resolvê-las, transformando-as em potencialidades.
Somente agora, após passar pelo processo de si mesmo, pôde enxergar o processo de seu pai. Ele, assim como você, está em processo de crescimento e evolução do espírito, onde cada conhecer é uma etapa, que quando finalizada, inicia o novo processo de outra e assim, sucessivamente, até a purificação completa.
No caminho encontramos obstáculos, ausências, decepções. Caímos no erro. Levantamos. Seguimos. E neste vai e vem de acontecimentos, encontramos o conhecimento. A transformação. O crescimento. A evolução.
Erramos sim. Muito! Todos nós. Pequenos ou grandes. Não importa, porém, quanto tempo nós erramos. Precisamos confiar, assim como o Pai, que um dia, assim como hoje foi o seu, aprenderemos e faremos diferente, a nós, ao outro, a vida.
Ficamos aí naquele dia. Nem mais uma palavra. E finalizamos num grande abraço coletivo regado por lágrimas. A caminho de casa, pensei em tudo que lembrava ter vivido até li.
Senti-me pequeno. Depois grande. Sozinho. Depois rodeado de afeição. Então, concluí que, a cada etapa de minha jornada, muito havia visto, sentido, feito e muito haveria o que fazer. O que é logico.
Mas pensei na trilha destes acontecimentos e assustei-me a cada desmedida com a que agi e, quantas vezes, culpei o outro e a Deus. Intolerante com meus próprios erros, lancei-os ao longe, nas costas de outrem.
Satisfeito por não ter mais o peso que me curvava, segui, sem olhar para trás. Porém, sempre o reencontrava disfarçado, e, insólito, refazia a tarefa, muitas vezes até não mais aguentar. Rugia. Bravejava. Agredia, tentando livrar-me do que era meu, somente meu e compartilhado com os outros.
Ah, Deus! Por que me abandonaste? Não sou um bom filho? Não o sirvo como deveria? Por que me deixa ao desespero? Por que não vem ao meu socorro? Por que me castiga?
Peço que retornem ao início do texto, ao primeiro paragrafo. E reflitam sobre as palavras de Samuel. Refletiremos juntos, em breve.
Gregório.
24.02.12