MENTIRAS E VERDADES

24/08/2015 22:16

Que bom possuirmos amigos que venham nos contar sobre a vida no novo mundo.

Imaginem chegar ao “outro lado” sem nada saber?

Embora, imagino eu, que teremos muitos outros questionamentos, pois somos únicos e temos necessidades diferenciadas, acalma-me o coração compreender como funcionam as coisas do lado de lá, mesmo sendo sobre outro olhar.

Nesta semana, no Momento de Luz, Madalena conta mais um pouco sobre sua trajetória na nova vida. Compartilhando seus anseios e suas experiências.

Boa leitura!

Andréa

 

 

MENTIRAS E VERDADES

 

Acordei cedo e fui dar uma volta. Perambulei por todo jardim. Precisava pensar. Já faziam dois longos meses que havia despertado e precisava agir. Precisava fazer algo por mim. Não sou do tipo que senta e espera. Nunca fui.

Havia cansado de ficar inerte na vida. Precisa resolver o que ia fazer dela. Já que existia vida, precisava usá-la. Como? Esta era a pergunta do dia. Pensei sobre as coisas que gostava de fazer. Sobre as coisas que desejava fazer e, principalmente, sobre as coisas que deixei de fazer.

Resolvi voltar para casa quarto ou quarto casa. Sei lá! Só tinha certeza de que, agora, aquele era meu lar. E o amava muito! Não porque era o que me restava, mas porque era tudo o que eu tinha. A minha vida, no momento, reduzia-se a ele. Precisa mudar. Precisa buscar novos horizontes.

Se já tivesse conhecido Gregório teria perguntado a ele, mas ainda não havíamos cruzado os caminhos. Logo, estava só. Vovô era adepto do aguardar e meu amor anjo também. Diziam: “Espera, tudo tem sem tempo”.

Nunca fui de esperar acontecer. Sempre me coloquei a frente, pois acreditava que a construção da minha vida pertencia a mim. E não a outro alguém, seja ele quem fosse: pais, avós, Deus.... Deles, eu obteria ajuda quando necessário, e só.

Aprecei-me como de costume. Não conseguia ficar parada aguardando alguém decidir o que faria da minha vida. Da minha nova vida. Pensar assim me estimulava. Nunca imaginei que teria outra oportunidade de viver, pensar, sentir, agir. Tinha pressa. Já era hora de aproveitá-la.

Não que ficasse de perna para cima durante todo o dia. Não sou assim. Acostumei-me a acordar cedo, fazer as refeições e meter o bedelho em tudo que achava pertinente. Tipo assim: detesto atividades da vida diária, mas adoro conversar, então, corria cedo para ajudar no refeitório. Conversava com os organizadores das refeições e, ao servir, conversava com os que foram degustá-las.

Tinha gente de todos os tipos. Cheios de histórias para contar. Sabia que cada de um de nós é um verdadeiro livro de histórias. Adoro lê-los! Conversava tanto que esquecia das obrigações e era sempre chamada a atenção. Meu coordenador dizia-me: “Converse, mas trabalhe. Ouviu mocinha”. E sorria do seu jeito largo, gargalhando enquanto comentava: “Esta aí é uma curiosa nata. Nuca vi igual. Ou já vi?” Contou-me depois que se lembrou de Gregório, que agia da mesma maneira. Não acham que foi por acaso que ele foi designado como meu cuidador, acham?

Pois bem! Esta era a atividade da manhã. Porém, do início da manhã ainda sobrava muito tempo até o auxílio do almoço, quando escutava o decorrer das atividades laborativas daqueles os quais servia. Histórias que me encantavam e chateavam também, pois todos tinham algo interessante para fazer. E quanto a mim?

Passava o resto da manhã, caminhando, tentando bisbilhotar salas, serviços, atividades alheias. Acompanhava o jardineiro, os construtores ..., mas sempre era mandada embora, pois consideravam que minhas milhares de perguntas atrapalhavam o serviço. Ficava de lá para cá, procurando o que fazer. E assim passava o dia.

Logo, decidi pensar sobre o que faria da minha vida. Queria ter certeza de qual caminho seguiria, pois, uma vez decidida, comunicaria as instâncias superiores. É que por aqui somos cuidados até o desenvolvimento. Entenderam? Acho que não. Tentarei explicar.

Quando resgatados, chegamos atordoados e precisamos de cuidadores, verdadeiros pais que nos auxiliam na nova caminhada. Literalmente seguram em nossas mãos para nos ensinarem a andar com as “novas pernas”. Pensam que é fácil? Muitos de nós chegamos por aqui descrentes da vida após a morte e precisamos compreender como funciona este novo mundo. Nós, novatos, brincamos que precisamos passar pela sabatina das mentiras e verdades.

Tipo assim: A morte do corpo físico corresponde a morte eterna – mentira. Existe vida após a morte – verdade. A vida após a morte resume-se em descanso - mentira. É possível namorar na nova vida- verdade. Chamamos de dúvidas mais frequentes (Risos). Minha verdade é que quero causar na nova vida, vivendo-a plenamente. E quero começar o quanto antes. Pronto. Era isso que diria ao meu cuidador. Iria conhecê-lo naquela tarde e comecei a ensaiar como me apresentaria e verbalizaria minha decisão.

Acho que ficou confusa esta nova informação. Vou clareá-la. Podemos ter mais de um cuidador. Como fui trazida pelo meu anjo fui cuidada por ele com a ajuda do meu vô quando cheguei. Agora, desperta, receberia um novo cuidador. Fui informada disso na noite anterior. Eles disseram-me que conheciam minha ansiedade e acreditavam que eu precisaria de um outro tipo de acompanhamento. Hein?! Não entendi. Eles, como sempre, me orientaram a esperar, pois os esclarecimentos chegariam. Entendem agora porque acordei nesta aflição. Ou melhor nem dormir. Estava ansiosa! Em cólicas!

A manhã demorou a passar e no almoço mau conversei. Estranharam meu silêncio. O coordenador da atividade, diferente das outras vezes, abraçou-me e, preocupado, questionou o que acontecia. “Estou sentindo falta da minha tagarela”, pronunciou. Acabei por chorar em seus braços, tamanha era a minha ansiedade. Liberou-me mais cedo. Não antes de me contar sua história, tomando uma xícara de chá para acalmar-me.

Chegado a hora, corri para o local combinado. Ele chegou cedo. Braços carregados de papeis. “Olá Madalena, sou Gregório. E antes que verbalize qualquer coisa, quero oferecer-lhe estes manuscritos para ler e este caderno em branco para pontuar seus questionamentos”. O resto vocês já sabem.

Madalena

23.08.15

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