VER ATRAVÉS DE OUTRO OLHAR

16/09/2013 08:24

Esta semana, no Momentos de luz, Gregório nos convida a reflexão. Após o relato de uma profunda vivência, deixa-nos dois questionamentos, comprometendo-se a retornar na próxima semana, quando voltaremos ao assunto.

Que tal realizar a mesma atividade que ele vivenciou? Talvez assim, possamos, mais facilmente, responder aos seus questionamentos.

Encontro-os na próxima semana.

Boa reflexão!

Andréa

 

 

VER ATRAVÉS DE OUTRO OLHAR

 

Certa manhã, levantei-me cedo e sai para caminhar. Atravessei todo o jardim, distraído com meus pensamentos. Nem me dei conta que já havia duas horas que caminhava, quando encontrei um grupo a conversar. Era um grupo animado. Sorriam a cada palavra dita. Então, curioso, resolvi me aproximar.

Notei que hesitavam em olhar uns para os outros. Olhavam para o chão, para o céu, para as árvores, mas nunca uns para os olhos dos outros. Fui ficando mais curioso. E decidi observar mais, antes de, finalmente, me aproximar.

Um rapaz jovem se posicionava no centro do grupo, vendado, dizia palavras de ordem. Enquanto os outros, olhos abertos a observar o mundo que os rodeava, descreviam o que era solicitado.

Falavam em voz alta, um após o outro, sem atropelamentos. Cada um, a sua vez, ia descrevendo, a partir do seu olhar, o que estava em foco. Interessante como relatavam diferentemente sobre o mesmo objeto observado.

- Árvore. Falou o jovem vendado.

- Pontos verdes a preencherem galhos que se balançam com o vento. Respondeu uma moça com lindos cachos, caindo aos ombros.

- Emaranhado de folhas verdes, que cobrem um tronco marrom escuro. Falou o que parecia ser o mais velho do grupo.

- Faíscas cor de musgo que preenchem ripas de madeira, que se agrupam, formando uma linda sustentação, que brota da terra e alcança o céu.

E assim, cada um elaborou e verbalizou a maneira que enxergava um pequeno pedacinho do mundo, que os rodeava. Resolvi anotar. Mas as primeiras palavras foram minhas. Uma pergunta. Para que?  

Depois que todos falaram. O jovem retirou a venda e passou para outro membro do grupo, que, a colocando, se posicionou no centro e escolheu o que queria ver com olhos do outro.

Ver, com os olhos do outro? Foi a próxima frase que escrevi. Acrescentei a interrogação logo depois. Sinal da minha reflexão. E rabisquei os pensamentos que iam surgindo. Vou apresentá-los, aleatoriamente, como surgiram, para depois concluirmos juntos.

Ver o que o outro ver.

Será possível sentir o que ele sentiu ao ver?

Olhar pelo ângulo dele, me fará compreender o que passa dentro dele?

Visualizar a mesma forma através de olhares diferente; tornaria a forma do objeto diferente da forma que vejo?

Percebi que era preciso experimentar. Então, ao término da rodada de descrições do céu, corri para o grupo e gritei ofegante: - Posso?

O grupo me olhou surpreso. Nem haviam me notado. E com olhar de questionamento se entreolharam.

Então, resolvi me apresentar. – Chamo-me Gregório. Sou escritor e estava a observá-los. Ao assisti a atividade que realizam, surgiram, em mim, muitos questionamentos. Estou curioso. Gostaria de tentar. Posso?

Olharam-se desta vez, olhando-me em seguida com olhar de aprovação. O último vendado estendeu-me a mão, entregando-me a venda. E a jovem dos cachos aproximou-se, ajudando-me a coloca-la.

- Que objeto deseja ver?

- Posso escolher dois? Respondi, questionando;

-Dois? Sim, mas um de cada vez.

-Ok. Desejo ver o sol.

Diferente do que possam imaginar, não olharam fixamente para o astro rei como o chamam, ofuscando a visão. Percebi aos relatos.

- Luz incandescente que ilumina minha pele, aquecendo-a.

- Faixa grossa de luz, resultante de pequenas faixinhas que se encontram, iluminando e clareando o céu em toda sua extensão, deixando-lhe de cor azul claro.

- Vejo-o nas águas, que o resplandece. Dividido em feixes de luz, as invadem, possibilitando-me ver a vida que se esconde no seu fundo.

- Luz que clareia as asas dos pássaros que nos sobrevoam, tornando-as suas cores mais vivas e belas.

- Pontos luminosos o formam, partindo dele para o todo e do todo retornam para ele, retroalimentando.

- Calor que me atinge e me faz suar. Que me faz alegre, ao mesmo tempo, que me causa cede.

Atento ouvia a cada relato. E percebi que cada palavra tocava-me diferente. Ao ver através do olhar do outro, me fez enxergar sois diferentes e senti-los como jamais o havia sentido antes.

O Vi em forma de pontos, feixes, asas, cores, peixes, flores, calor. Era como se diferente formas de sois pudessem estar no céu, cada um assinado por um escultor diferente.

Senti-o forte, fraco, belo, bizarro, engraçado... Fez-me rir e chorar. Fez-me amá-lo e odiá-lo. Senti o sol intensamente, não pelos seus raios a me tocar, não mais o conseguia. Naquele momento, estava sendo tocado pelos relatos.

Ao fim, questionaram-me. Que mais queres ver?

- A mim. Respondi com medo e convicção.

Não vou pôr, aqui, os relatos. Não conseguirei descrevê-los com precisão, pois envolvido por eles, fui atingido por grande emoção. Descreverei o conjunto deles (relatos e emoções) que ficou registrado em mim.

 

! Um homem alto em curiosidade que se atreveu nos invadir, sem ao menos questionar o que fazíamos e se colocou a vivenciar que estávamos a fazer.

! Um par de páginas em branco querendo existir.

! Um livro entreaberto que se precipita pelos caminhos a captar o que vê e sente.

! Um espírito perdido e errante que deseja desvendar quem é, e onde está inserido.

! Um suave sorriso que teima esconder-se, por não enxergar as cores que embelezam a vida.

! Mãos ansiosas por relatarem o que está ao seu redor.

! Um par de olhos que desejam entender como se sente o outro, a partir de seu olhar.

Dizeres que descreveram um homem tão igual e tão diferente daquilo que realmente sou. Como me leram?  Sou o que mostro ser?

Deixo-os com dois questionamentos, para que possam refletir até a próxima semana, quando novamente conversaremos.

 

Como me vejo e vejo o outro?

Como me mostro e quero ser viso?

 

Até breve!

Abraço afetuoso, Gregório.

16.09.13

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